ARTIGOS


A personificação da política

Adeli Sell

 

A luta pelo poder é constante na política, e os partidos políticos não são exceção a essa regra. No Brasil, tendo a ver algumas diferenças, sem desconhecer a força dos partidos regionais na República Velha, também conhecida como Primeira República quando o Brasil, em 1889 deixou de ser governador por uma monarquia a passou a ser comandado por presidentes.   

Com o período de Getúlio Vargas no governo, em 1937 ele implantou a ditadura do Estado Novo, sendo deposto do cargo em 1945 e na década de 50 voltou ao poder, por eleição via voto popular.

No Rio Grande do Sul, a novidade no sistema partidário pós 1945, foram a formação do PTB, e o fortalecimento da UDN e do PSD. Muito embora, tendo a pensar que o brizolismo foi passando a força para sigla à qual pertencia (PTB).

E na atualidade? A pesquisa Atlas de março/24 aponta o PT como partido preferido por 34,6% dos entrevistados, seguido do percentual de 29% de quem não tem partido. Na sequência aparece o PL.

No PT está Lula, que promove a reflexão sobre o fato de o lulismo fortalecer a sigla partidária. No PL sabemos, ele é influenciado pelo bolsonarismo, mesmo que com alguns baques.

No entanto, no mundo o cenário aponta que não se trata, nem se vota na sigla, mas sim na personificação de um candidato ou um “líder”, quase como se fosse uma devoção.

Por exemplo, na Argentina, em 2021, surge La Libertad Avanza, populista e que elege como presidente o líder Javier Milei, tido pela mídia como "anarcocapitalista". Foi uma eleição em que havia uma persona, um fulano, um tal, um Milei, que derrotou o velho peronismo.

Na Alemanha, com forte tradição nos partidos como a Social Democracia, como o PC e a Democracia Cristã, surgem novidades. Surge uma agremiação com o nome de uma mulher: Sara Wagenknecht. Ela tem 55 anos, mãe alemã e pai iraniano. Teve sua formação político-partidária na Alemanha Oriental.

Sara criou o BSW - Bündnis Sara Wagenknecht -  Aliança Sara Wagenknecht. Ou seja, chama para si a criação de um movimento que cinde o Partido "A Esquerda", o “Die Linke”, arrasta mais deputados e vai para a disputa, buscando abocanhar o descontentamento reinante com Olaf Scholze, na era pós Merkel.

Ela defende, segundo leio, políticas econômicas de esquerda, com uma visão social conservadora, criticando a aceitação acrítica dos migrantes, por exemplo. Critica as ajudas desmesuradas à Ucrânia, prejudicando relações com Putin.

A pergunta é: é positiva esta personalização ou fulanização da política? Corremos grandes riscos, principalmente quando os "partidos da extrema direita", evidenciam a face nazista, onde o espaço nos holofotes não para os partidos, mas para as personas.

Certo ou errado?

Voltando ao Brasil, vemos que a peregrinação do “inominável” pelo país ainda junta pessoas em torno de si. Não é fortuito que seus asseclas ainda o chamem de "mito", seja lá o que for. É uma figura caricata, como Milei e Trump. Assim, por que motivos surgem tais figuras?

No caso do PT, a sua fragmentação organizativa, o esfumaçamento de suas grandes correntes (vertentes políticas em disputa desde o nascedouro) faz aparecer o poder dos mandatos de seus parlamentares seja em nível nacional ou local. Ou seja, mais uma vez é o grupo do "fulano de tal", é a "turma do vereador X".

Tem espaço para um PT raiz? Aos moldes de seu nascedouro não tem não. Mas creio que há espaços para além dos parlamentares e seus agrupamentos. As pessoas pensam, querem falar, opinar, dizer o que e como fazer? Mas o que fazem os petistas dirigentes? Até aqui não foi feito nada, nenhum gesto de sua direção nacional para as bases se moverem em novos espaços.

Creio que o financiamento das campanhas está com os "capas pretas", com os caciques em todos os partidos. Agora, para estas eleições, parece que haverá alguma rebeldia na base do PT. Isto seria altamente benéfico para a sua efetiva oxigenação.

Creio que o caminho da "fulanização" da política não é coisa boa nem no Brasil nem na Alemanha de Sara.

As bandeiras de Democracia como valor universal, as liberdades, a defesa dos direitos humanos são temas que vão além de personalidades.

São temas para organizações ou não?

E o que pensar do nosso leitor?

Temos espaço para o debate?

 

Adeli Sell é professor, escritor, bacharel em Direito e vereador do PT em Porto Alegre.