ARTIGOS


Ensaio sobre a insensatez

O Ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete – Aristóteles.

Nosso objetivo é refletir, pensar, ponderar, questionar o mundo líquido, movediço da falta de bom senso, de falta de ponderação, da imprudência.

Não falo de loucura, por considerar inadequado apor este termo aos de insensatez.
As ciências nunca tiveram tanta evolução como nos últimos séculos.

A máquina a vapor no passado como a Internet na atualidade, cada qual a seu modo, jogam a Humanidade para uma dimensão não sonhada.

A ciência derrotou o senso comum em todas as dimensões, mas há pessoas que nunca aprendem.

Se uma pessoa ignorante, sem acesso a informações, sem os discernimentos mínimos comete afrontas à ciência, deve-se entender o seu contexto, sua vida e sua posição.

Mas a insensatez tem várias dimensões, uma delas é em nível de dados e de informações, quando a pessoa sem responsabilidade reproduz o senso comum, mesmo que na sua condição não poderia fazê-lo. Às vezes, nem chega a ter consciência da dimensão do que fez ou faz. Mas faz estragos na vida de pessoas. Sempre.

No outro lado, a insensatez vem do topo da sociedade, seja de governantes ou pessoas, que reproduzem ou defendem o que seja a seu gosto, a seu favor, contra os direitos da maioria do povo.

A mídia dos EUA nos anos 30, 40, 50 comprou as invencionices de um marqueteiro da United Fruit contra governos legítimos da América Latina, vendendo a eles e estes reproduzindo que um governo como o da Guatemala do progressista Jacobo Árbenz estava a serviço dos russos.

Nada mais parecido com as Fake News da atualidade e a ação de Edward L. Barneys, o mequetrefe destas mentiras, era a dimensão latino-americana do atual de Steve Bannon em nível mundial.

O romancista octogenário, Prêmio Nobel de Literatura, Mário Vargas Llosa, conta esta história em forma de romance em “Tempos Ásperos”.

Sempre houve estes engravatados bandidos de aluguel, com Giuliano da Empoli relata em livro recente “Engenheiros do caos”.

Neste livro Giugliano da Empoli traça um panorama sobre a onda de extrema direita que se apossou do mundo nos últimos anos. Embora o livro tenha mais enfoque no Movimento 5 Estrelas, da Itália, país do autor, ele também estende suas análises e comentários para os Estados Unidos, Inglaterra, Turquia, Hungria, França e, como não podia deixar de ser, para o nosso Brasil.

No romance de Vargas Llosa, não temos apenas o relato do golpe contra o presidente da Guatemala, como a história das conspirações internacionais durante os tempos críticos da Guerra Fria. Seu olhar se volta para o presente, para mostrar que este episódio ainda guarda traumas que ainda não foram superados.

Algo muito próximo dos episódios de repressão no Cone Sul, Brasil, Argentina e Uruguai, marcas que não se apagam, dores que não se curam, cicatrizes que não se tiram com uma cirurgia plástica.

Estas coisas se embrenham em nossas almas mortais, mas que perpassam de geração a geração dos que sofreram.

É a mesma insensatez do racismo estrutural que Sílvio Almeida traça em seu livro sobre o tema.

A quem agia de boa-fé, a partir do Direito sabia que havia um golpe midiático-legislativo-judicial em curso para tirar uma presidente eleita democraticamente. A mídia envolvida fez o mesmo que a americana para ajudar a CIA a dar golpes e aqui para fazer o seu golpe, com o impedimento da presidenta Dilma Rousseff.

Em 1925 Hitler tentou um golpe e virou piada. Não acreditaram no papel que já cumpria. No filme “O ovo da serpente” de Igmar Bergman fica evidente este desdém na cena final.

Depois do nazi-fascismo, dos massacres de judeus e tantos outros, depois de Ruanda, era difícil pensar que pudessem surgir Trump, Bolsonaro e ouros psicopatas sociais.

Mas eles estão aí.

Trump foi derrotado pela sensatez de milhões de jovens americanos, dos movimentos “Black Lives Matter”, dos democratas de raiz.

Em 1904 no Rio de Janeiro houve a Revolta da Vacina A varíola matava. A vacina já tinha se tornada obrigatória em 1837. Em 1903, o governo resolve fazer nova lei. Estoura a vacina, e toda a sorte de preconceitos afloram, e a insensatez partiu dos castilhistas no Congresso que se opuseram, e isto que tinham tudo para ajudarem, pois sua vertente filosófica era o Positivismo.

A insensatez humana é destruidora.

Os ignorantes afirmam que o cloroquina e a invermectina curam a Covid 19. Eles afirmam e querem que todos os outros acreditam neles. Os médicos dizem não, mas eles insensatos do mal continuam a desdizer a ciência.

Hoje em dia seria sensato duvidar de muita coisa que circula nas redes sociais. Seria. Mas há muita gente insensata, pouco sábia, porque o sábio duvida e pensa. Estuda e pensa.

Os sensatos como Aristóteles refletem.

Nós nos somamos ao pensador grego e refletimos sobre tudo o que se passa.

A insensatez aduba a banalidade do mal.

A insensatez rega as veias abertas de todos aqueles que afirmam tudo com certeza.

A insensatez não se cruza com os sábios que duvidam.

A insensatez é o ancoradouro dos que não conseguem pensar, e quando pensam é para fazer o mal, pois assim são, por exemplo, os fascistas e os genocidas.


ADELI SELL é bacharel em Direito, escritor e consultor.