ARTIGOS


Porto Alegre em sua semana

No dia 26 de março, Porto Alegre completa 249 anos. Somente no início do século XVIII que europeus e migrantes de outros estados começaram a vir para cá.
Em 1740 Jerônimo de Ornellas se tornou sesmeiro do Império. Ele tinha um grupo de 100 madeirenses como ele. Em 1752, chegaram os 60 casais açorianos. Ficaram aqui jogados por 20 anos, na vã esperança de irem para as Missões. Pouco se sabe de nossos indígenas, supostamente guaranis. Havia, isto havia: Gravataí foi Aldeia dos Anjos.
Em 1772, por uma provisão régia, viramos Freguesia em 26 de março.
Quase 250 anos depois de nossa "fundação", vivemos o drama de todos mundo afora: a pandemia. Não vai ter baile na Redenção nem no Gasômetro. Não vai haver espetáculos. Nem vai ter ajuntamento em Ipanema. Saudações por vídeo, papos no facebook e outras mídias nos irmanarão. Da  Orla ao  Morro Santana era uma distância tamanha; agora, a Internet encurta.
 
"Peço-te o prazer legítimo
E o movimento preciso
Tempo, tempo, tempo, tempo
Quando o tempo for propício
Tempo, tempo, tempo, tempo"

 
Sigo a voz de Caetano e minhas lágrimas impedem-me de uma saudação, pois  amigos(as) que perdi para o maldito vírus não saem de meu radar, e a cabeça lateja com a dor da perda.
Queria falar da velha Rua da Praia, dos tempos dourados da Praça de Alfândega,  das sessões de sábados à meia noite, dos papos-cabeça no Largo dos Medeiros, do flerte com a Esquina Maldita.
Queria  falar do Lunara que com suas fotos deixou a marca dos negros, que tantos  fizeram de tudo para não falar, para apagar, para mandar para a periferia. Por ele, vejo negros no Mercado e lavadeiras no Guaíba.
É claro que me negaria a falar dos prefeitos malditos, pois em "festa de anos" a gente deixa a tristeza de fora.
Mas a cidade a gente ainda arruma, peleia por ela a vida toda, mas a morte atropela e leva nossos entes queridos, para nunca mais voltar. Cabem as lembranças. Por isso, nestes 249 de Porto Alegre será o ano das lembranças.
Neste mundo cibernético, de estar em todos os lugares, os barcos do Guaíba também viram lembranças de um rio que é lago. E neste mundo de Internet ficam as imagens, das festas que já tivemos, seja em casa ou na Festa de Navegantes. Seja numa igreja ou num terreiro. Que  sejamos um Lunara que clicou e deixou a marca dos que fizeram a cidade: os negros, os açorianos, os madeirenses, os portugueses, os espanhóis, os indígenas, os tropeiros, os alemães, os italianos e tantos e tantos outros. Não vamos esquecer ninguém.
Ninguém pode apagar que somos uma das cidades mais multifacetadas do país. Ninguém apagará nossos erros e nossos apagamentos, pois ensinam a não repetir o erro. 
Rumo aos nossos dois séculos e meio: caminhantes seguiremos. #poa250
 
ADELI SELL é escritor e consultor