"Apresento e ofereço este texto ao Adeli porque reconheço nele uma liderança democrática, que dialoga com quem pensa diferente dele, respeitando as diferenças, e busca construir consensos para a solução dos problemas da cidade".
- Os que cresceram nos anos 50 e 60 ouviram uma frase então muito comum entre pais: “Só o que temos para te dar na vida é educação”. A chance de estudar para ter uma boa profissão era a garantia de uma vida melhor. Neste período, no Brasil, a maioria da população vivia no campo e as escolas públicas eram urbanas e um privilégio da classe média. No Rio Grande do Sul, a escola primária era considerada um modelo para outros estados e a Secretaria de Educação mantinha uma equipe pedagógica que apoiava as escolas em suas atividades de ensino.
- Hoje, no século XXI, numa sociedade em que a informação, o conhecimento e a tecnologia se desenvolvem continuamente, a educação se tornou um passaporte para as posições no mundo do trabalho: a extensão da escolaridade e a qualidade da educação recebida remetem aos cargos de direção e aos de simples execução do trabalho, que tende a se reduzir cada vez mais com o desenvolvimento tecnológico.
- Além de passaporte para as diferentes posições no mundo do trabalho, a educação, desenvolvendo diferentes habilidades, permite que as pessoas possam decifrar o mundo em que vivem, identificando na vida coletiva as lideranças e os representantes mais capazes de responder a suas necessidades e de organizar a vida coletiva da forma que lhes parece melhor.
-No século XXI, no Brasil, a ampla maioria da população vive nas cidades e as escolas públicas abrigam a maioria dos segmentos populares, sem contar com os recursos financeiros e institucionais necessários para garantir a qualidade de ensino que já garantiram às classes médias no passado, quando a escola pública era a referência de qualidade frente às escolas privadas. Situação inversa à vivida atualmente
-Neste quadro, a educação pública tem, hoje, uma enorme responsabilidade de democratizar o acesso de todos a uma educação de qualidade. É preciso garantir o acesso, a permanência e a qualidade do ensino, entendida como a aprendizagem correspondente às diferentes etapas escolares. É preciso aprender a ler e escrever, desenvolver o pensamento matemático, compreender a natureza, as formas de organização das sociedades e a cultura humana. Uma escola pública que não garanta uma educação de qualidade aos setores populares está privando-os do preparo necessário para o exercício crítico da cidadania.
-Uma escola pública de qualidade precisa de boas instalações, equipamentos e material didático.
-Precisa de um tempo de permanência dos alunos na escola que não se restrinja a algumas horas apenas, mas conte com o maior tempo possível, para desenvolver diferentes atividades.
-Precisa de gestores que sejam capazes de liderar a comunidade escolar, professores, funcionários, alunos e pais, em um projeto em que o central seja o compromisso com a permanência e a aprendizagem dos alunos. Gestores de escolas precisam de vários conhecimentos específicos para os quais os professores não foram preparados em seus cursos de formação. Cabe à Secretaria Municipal de Educação fornecer as condições para que os diretores de escolas e as equipes diretivas possam se qualificar para desempenhar seus papéis de gestores da melhor forma.
-A escola pública precisa ensinar de fato, relacionando os conteúdos que ensina à vida e ao mundo dos alunos, para que os conteúdos possam ser de fato compreendidos. A professora Esther Grossi nos falou, com razão, que todos os alunos podem ser alfabetizados, desde que os professores realizem o trabalho da forma correta. Ela já demonstrou o que afirma em projetos dos quais participou em diferentes escolas públicas de diferentes estados do país. Os professores, nas escolas públicas, diante de alunos cujas famílias têm menor acesso aos recursos culturais em geral e, inclusive, aos recursos materiais necessários ao estudo, precisam do apoio da Secretaria Municipal de Educação para desenvolverem um processo de formação continuada, na própria escola em que trabalham e sobre a própria atividade docente que realizam, de forma que o aprendido reverta em melhoria de sua docência e melhor aprendizagem dos alunos. Não adianta remeter os professores a cursos de especialização, mestrado e até doutorado que não revertam na melhora de sua prática docente. O objetivo final da escola é a aprendizagem dos alunos e toda a organização da escola precisa estar voltada para ela.
-É preciso que os professores sejam remunerados de forma justa e que não precisem trabalhar em diversas escolas ao mesmo tempo para poderem sobreviver e é preciso que tenham uma carreira que os incentivem profissionalmente. Isto é uma das condições para a construção de uma escola pública de qualidade.
-É preciso respeitar o espaço de autonomia de cada escola para a organização de suas atividades, mas é preciso garantir que todas proporcionem ao estudante, não importa em que escola da rede ele se encontre, ensino de igual qualidade. E os professores para garanti-lo precisam do apoio pedagógico da Secretaria Municipal de Educação, para preencherem as lacunas de conhecimento e as lacunas pedagógicas que os impedem de realizar um trabalho docente melhor e mais satisfatório para eles e para seus alunos.
-Uma escola pública para todos e de qualidade não será obra para quem só tem interesses imediatos, pois sua construção é uma longa jornada, nem será construída por um líder político, um partido ou uma coalização partidária apenas, ela só poderá ser construída por lideranças efetivamente democráticas, que souberem reunir todas as forças sociais e políticas nela interessadas e souberem construir consensos, ao mesmo tempo respeitando as diferenças. Tarefa difícil, sem dúvidas, mas necessária e único caminho para que a educação possa ajudar a garantir um espaço de convívio social civilizado, democrático e justo.
Maria da Graça Bulhões, graduada em Letras e em Ciências Sociais, doutora em Ciências da Comunicação.