ARTIGOS


PARA MULHERES QUE... (E para homens mais ainda...)

ADELI SELL*

 

                Estou tentando com estas linhas adentrar o mundo feminino de Cecília Kemel. Seus cabelos prateados não desmentem sua longa trajetória com a escrita, ainda mais que é uma pessoa contida. E isto me encanta, pois sou daqueles que estou mais para as leituras de Clarice Lispector. Até porque nos dias atuais, no mundo das ansiedades, vejo escritoras tentando mostrar seu valor em publicações e mais publicações, como se debulhassem milho para as galinhas.

                O livro que acabo de ler é de 2023 pela Editora Bestiário. “Para mulheres que...” poderia ter um subtítulo como fiz na chamada: “E para homens mais ainda....”. O livro é contido, tudo é conciso, burilado, nada fica sobrando. E cada conto tem seu recado para os homens.

                A autora fala que são semicontos, mas não no sentido de “meio” contos, “semi” porque tem partes que são mais que contos, são filosofia e sociologia de costumes.

                Ligia Sávio, esta outra escritora do cuidado com a palavra é outra cabeça prateada que no Prefácio acerta ao dizer que vamos encontrar “pitadas de ironia e crueldade”.  Ligia fala que há “uma linguagem elegante e refinada”. Isto mesmo.

                E como diz a autora no “Depoimento”: “... é tudo verdade”. Não é fortuita a citação de Clarice em seguida:

                “Os sensíveis são simultaneamente mais infelizes e felizes que os outros”. Conscientemente ou não a autora esbanja estas contradições ao longo de seus curtos textos: “um sim e um não”, “não há acertos nem erros”, “é muito, é pouco”, “depois de tanto e de tão pouco”, “foi e é”... Chega!

                E tem passagens de se anotar e marcar: ”Bom, eu me acertei com a vida, porque me vi ao espelho; Sorriso torto, língua ferina. Riso colado no rosto. Ironia é meu nome.”

                Mas por que “E para homens mais ainda...”? É para que o oposto, o outro sexo, possa entender mais as mulheres.

                A autora por narrar na primeira pessoa, os textos podem ser lidos como a vida de uma mulher e seus relacionamentos, suas vivências e observações como em “O abacateiro” onde tem a compreensão do que outra mulher passou; mas pode ser qualquer mulher, podem ser todas as mulheres do mundo.

                E neste tipo de escrita que está a universalidade do texto, podendo partir do eu, do particular, do grupo para abarcar o mundo.

                E assim estamos fazendo a boa Literatura no Rio Grande do Sul.

 

ADELI SELL é professor, escritor e bacharel em Direito.