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Carnaval, Facebook e Homero - Adeli Sell

O que seria da Ilíada de Homero, se não fosse seu enredo. Sempre soube que Carnaval tem que ter enredo. Acho que, neste ano, teve, como sinaliza o debate que acompanho.

            Pouco sei de Carnaval, mas lá em Cunha Porã, terra de alemães e italianos, se pulava Carnaval em salão de baile.

            Quando cheguei aqui em Porto Alegre nos anos 70 eram fortes os desfiles na Santana. A Pepsi patrocinava. Nem era cerveja. De lá para cá, acompanho como dá nosso Carnaval. Já disse que tomo água do Dmae e gosto do nosso Carnaval.

            Acho que aqui tudo é mais suado, mais complicado. Tem gente querendo tocar o Carnaval para bem longe. Foi assim todo o debate sobre o tal do “sambódromo”, que virou “Porto Seco”, longe de tudo e de todos.

Carnaval pode causar transtornos?

            Não.  São as pessoas que, com ou sem Carnaval, são bárbaros e deseduca dos,  em quaisquer circunstâncias.

            No Rio, o prefeito põe seu credo acima do bem comum e some. O governador se retira para uma praia e diz que erraram no planejamento.

            Aqui, o governo local engambelou o pessoal das Escolas de Samba, largou o Sambódromo na mão deles, e continuamos com nosso Carnaval em março. O prefeito viaja para o outro lado do mundo, no momento em que povo retoma nosso Carnaval de rua, cresce, se perde o controle do processo civilizatório. Não organiza como deveria ter feito. Deixa na mão da Brigada Militar, como se fosse um caso de polícia, como fora o Carnaval, o samba e a capoeira no início do século XX.

 

            E o Facebook?

            Pois há pessoas que fizeram dele um banheiro público sem limpeza e sem controle. Há quem passou os festejos de momo lendo a Ilíada de Homero. Outros leem poesia. Outros ouvem funk. Tem os que só vanerão. Alguns se queixam que mexeram com a novelinha. As pessoas não são iguais. O que importa é que se viva em paz, harmonia, com respeito e com dignidade.

            E no Facebook, bem no Facebook , tem arrastão o tempo todo. Roubam nossa paciência, humor, dignidade, sonhos e esperanças. Mas querem roubar, na verdade, nosso cérebro e alma.

            Mas, ainda a cada Carnaval, ouvir aqui ou ali as velhas marchinhas ingênuas,  sem a censura do politicamente correto,  é um bálsamo para a alma, antes que ela nos seja arrancada no arrastão do Facebook.

Pena que não temos mais aquela memória da antiga Guaíba, nas pesquisas que eram feitas por seus radialistas, para apresentar o que havia sido criado até então. Era uma maravilha.

            E, agora, alguns, de um lado, escondem os protestos, de outro,mostram um rolê como se fosse o fim da civilização, mas não vi nada quebrado.

            Já o Getúlio era fulminado com marchinhas ousadas. O Juca Chaves falava do presidente bossa nova, referindo-se ao Juscelino. A vida é assim e deveria ser assim. Com crítica, sabedoria e humor.

            Quando a Tuiuti desmonta a farsa da grande mídia, da Fiesp e quejandos tem gente que ataca de todos os lados, mostrando mais uma vez seu profundo preconceito como esta Escola da periferia.

            O centro sempre se sente sufocado pela periferia. É contra a lei da Natureza. O andar de cima acha que no andar de baixo tem um Nero para tacar fogo nele.

            Pouco sei de Carnaval, mas não teve racismo na Salgueiro.Fizeram aqui no Facebook leituras rebaixadas, imputando para a Escola de Samba do morro os Black Faces do racismo americano. Aí é um desconhecimento histórico e uma forçação de barra.

            Vamos nos respeitar.

            Pomeranos e ciganos, como negros e índios, sofreram nas patas do poder a fome e o preconceito. E se os de baixo se dividir, os de cima vão continuar nos pisando todos os dias.

            Hoje, vejo que o grito da Tuiuti também vale para os que veem o demônio e o vampiro fora do Inferno e da Transilvânia. E me dá aquela vontade de reler a Ilíada. Ah, como faz falta a boa literatura, mas sem preconceitos leia qualquer coisa, que faz bem.

            Mas afinal e o Carnaval gauderio? Um vexame é o comportamento do Paço Municipal. A resposta tem que ser, com dinheiro ou sem dinheiro, a gente faz o Carnaval no Porto Seco, nas ruas com zelo para o leitor de Homero não se distrair do enredo, para a tia ver sua novelinha. Mas a gente faz

            Deixa também os desavisados em paz com o Luciano e com o Fausto deles. Concentra seu viver nas coisas boas da vida Deixa o samba correr em suas veias.

            O arrastão aqui tem que ser aquele da paz, da harmonia e do respeito.

Mas a gente quer Brigada, DP aberta, guarda municipal e azuizinhos nas ruas.

A gente não quer nada a mais nem demais.

            Quer Carnaval nas ruas dos Bairros.

            Não esqueça que tem lugares que não dá; não insista querer o mundo só para si.  Tem lugares e horas para tudo.

            A gente quer descentralização do Carnaval e da Cultura.

            A gente quer espaços para um seguro Carnaval para as crianças também.

            A gente quer Carnaval nos Clubes.

            A Prefeitura tem obrigação de estar presente e os gestores não podem sumir nestes momentos

            Largue um pouco o 'face', vá para a 'street', senhor Prefeito.

            Ah, temos mais...

            A TV está perdendo.

            Desliga um pouco.

            Ocupa a praça

            Exija que ela seja limpa e segura, e manda um MSN para o prefeito sair do Facebook, esperando que ele não fique brabo nem incomodado.

Mas afinal quem quis ser prefeito foi ele; que governe!