A vontade de gritar era grande. Mas fiquei com tudo engasgado. Explico o porquê. Almocei no Chalé, uma relíquia que ajudamos a salvar e ampliar. Dali fui ver o "novo Guaspari". Ali comprei as primeiras roupas quando cheguei em Porto Alegre, em 1972.
Fiquei imaginando o professor, artista e arquiteto Fernando Corona subindo ao sétimo andar para um café, olhar o Guaíba e lembrar que no início dos anos 30 ele botava de pé o primeiro prédio modernista da cidade. Lembrei da arquiteta Alessanda Bonotto Paim, que tinha proposição ousada para o local. Ficou legal, mas esperava mais.
Dali cruzei a Galeria Chaves para continuar minhas lembranças e sentir um pouco mais das obras do Corona, que da Espanha veio nos ensinar arte. Quando botei os pés na Rua da Praia, já na frente da antiga Livraria e Editora Globo, me bateu a revolta, daquelas que reviram o estômago, aceleram o coração e dão dor na cabeça. Não tinha mais rua, só um mercado de ilegalidades.
O que fizeram ou deixaram fazer com a Rua da Praia de Nilo Ruschel? Estou relendo o livro dele para não “baquear” de vez. Lembrei das várias cobranças que recebi nesta curta caminhada por parte das pessoas, reclamando do desdém com o nosso Centro, com a Rua da Praia, com a cidade.
Só não gritei porque achariam que enlouqueci de vez e também para não ser agredido por algum “pirateiro” como já fora no passado. Me pergunto. Onde estão as pessoas a caminhar? Onde estão os grupos a papear? Claro que não mais encontraria o Osvaldo Vergara, Moisés Velhinho, Osvaldo Aranha, o Athos Damasceno, o Spalding, mas queria encontrar ali o Benedito Tadeu Cesar, o Jorge Barcellos, o Rui Gonçalves, a Jaqueline Moll, a Liana Borges, a Margarete Moraes, o professor Fischer, o Ricardo Guliani, o Moisés Mendes, entre outros tantos. Juro que nesta semana chamo o Ayres Cerutti para a gente tratar do nosso livro sobre o Centro Histórico, no Café da Renner.
Pensei nos cafés do passado e me meti na Acylino de Carvalho, para tomar um no Café do Mercado, já que o Rian sumiu ali do Edifício Santa Cruz, onde tem uma das nove farmácias na mesma quadra, as quais expulsaram a diversidade e o encanto dali.
A Rua da Praia mais parece um ossário exposto de um corpo colorido do passado. E isso que já se chamou Rua da Graça entre a Alfândega e a Santa Casa. Hoje, uma desgraça. Tudo o que vi foi chocante com o meu passado recente, quando fui titular da pasta de Indústria e Comércio há pouco mais de uma década atrás, quando fiz a Rua ser Rua e as calçadas, calçadas.
E será mais insustentável a continuar com a pasmaceira, desdém e inoperância dos governantes atuais. Mas como Henry David Thoreau que se negou a pagar impostos há quase 200 anos atrás, com a Desobediência Civil, eu continuarei de mangas arregaçadas com as armas da boa luta democrática, do diálogo com pressão, com minhas articulações para não sucumbir, sendo um rebelde com causa para não passar para a História como omisso.
Pois lhes direi: se eu fosse prefeito, resgataria a Rua da Praia para as pessoas, para uma Porto Alegre novamente inclusiva.