ARTIGOS


Rua da margem – Histórias de Porto Alegre (Adeli Sell)

Acabo de ler mais um livro do jornalista Paulo Cesar Teixeira, autor dos festejados ‘Esquina Maldita’ e ‘Nega Lu’, os quais já resenhei e comentei.

Paulo Cesar e sua filha Luísa Rosa tem um portal chamado Rua da Margem – www.ruadamargem.com

Este livro, como diz o subtítulo, trata de “histórias de Porto Alegre”, a maior parte delas ambientada no Bairro Cidade Baixa que alberga a Rua da Margem, atual João Alfredo.

Começa com as contações do “barão da João Alfredo”, com a bengala, dando uma panorâmica dos velhos tempos.

Dele, o autor pula de bar e boteco. Vai ao passado e volta ao presente nos apresentando o “pé sujo” mais alternativo da cidade, o Bambu’s, no Bairro Independência. Deste passa para a Lancheria do Ildo no Bom Fim. Sim, o Ildo conhecido garçom da Lancheria do Parque.

A parada seguinte é no Parangolé (voltando à Cidade Baixa) para falar dos parangolés de Cláudio, a fim de falar de boa música.

O próximo “point” será o Porto Carioca, da Joicy, de Belfort Roxo veio parar por aqui, para fazer muita caipirinha, bebida mais do que brasileira.

Deu água na boca? Calma. Tem mais. Na Rua da Margem (João Alfredo) tem as coisas do Pé Palito, o qual dominou por tempos a cena boêmia da cidade.

Da Cidade Baixa, o autor vai dar um pulo para o IV Distrito, que finalmente está virando um polo etílico-cultural. Temos ali a aparição de locais descolados. Narra o que se passa num galpão de um fim de rua sem saída, o Agulha. E como só poderia ser: quem procura acha até em palheiro a boa música, ali reinante.

Do local vintage voltamos e vamos ler as reminiscências do Celso Finatto com histórias nunca antes escutadas da Cidade Baixa. Ele é o dono do Oficina Etílica, um dos primeiros bares a se instalar na fase boêmia que a João Alfredo veio a se tornar.

Destas pessoas-personagens, vamos adiante para conhecer outra figuraça que é a Valéria (nascida Rodrigo Barcellos) em Santo Ângelo. Imaginem só. Foi a professora Clenir quem pela primeira vez prestou atenção em sua voz e a botou na parada para não parar mais. Rodrigo que virou Valéria ganhou o troféu Mulher Cidadã da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Ela é um barato.

Em seguida vem Elisa Meneghetti, uma grande voz da nossa cena local atual.

Logo adiante vem o nosso Santiago, descrito pelo autor como “os caminhos de Santiago”. Paulo Cesar caminha pelo humor gráfico deste gaúcho que da indignação faz graça para todos nós.

A próxima cena é ocupada por Arlete Cunha que se descortina no Teatro Infantil até chegar a a(re)presentar as obras da Hilda Hilst,

O povo com todas as faces traz a presença da Mãe Ieda. Mãe Ieda, do Ilê Nação Oyó. Líder comunitária do Centro de Umbanda Superior e ela já foi tema de dissertação.

Entra em cena um outro personagem de bengala a quem o autor se refere nos agradecimentos: José Alberto Mainieri. Representante comercial, não gostava do estudo formal, mas pelo relato se vê que viveu como deve ser vivido. Achei uma frase dele lapidar: “Acho que, na vida, existe uma tênue divisória entre o riso e o choro”.

Um outro texto marcante, todos são é claro, mas este me toca de modo especial: o texto sobre a primeira galeria da cidade ao falar da Galeria Chaves. E o autor começa a colocar os ‘pontos nos is’, ao dar a data de 1930 como o ano de inauguração. Como sendo obra onde o grande Fernando Corona teve papel de líder só poderia ser esta data, porque é uma obra neoclássica, já que em 1936 Corona nos dava a primeira obra modernista da cidade, o Guaspari.

Temos ainda uma panorâmica dos mais de 40 anos do Brique da Redenção. Sem retoques.

Lembra e relembra a história de nossa Banda Municipal, da ousadia em formação ao desdém dos tempos de infortúnio.

Passeia pelo tema das malocas, favelas, dos bofes, dos que sofrem preconceitos, num texto tocante chamado “O bofe nas vilas de malocas”.

E nos traz de volta aos botecos para conhecer o “Veg Boteco”, o Bar do Tio Lu, uma invenção graciosa por parte de um grupo de veganos.

E conclui com um belo cenário no distante Bairro Sarandi, apresentando algumas personagens, como a bibliotecária Pri, Priscila Macedo, uma ativista da leitura como a colega Bianka. Ali temos na Praça Oliveira Rolim a Biblioteca Girassol, na Zona Norte, bem distante da nossa Rua da Margem, na Cidade Baixa.

Assim, vos indico com louvor o livro Rua da Margem – Histórias de Porto Alegre – do jornalista Paulo Cesar Teixeira, editado pela conhecida Libretos, em 2019.

 

 

Adeli Sell é escritor, bacharel em Direito e vereador em Porto Alegre.